CARTA AOS PAIS AUSENTES

Este texto é para todos os homens que, num determinado momento da sua vida, se despiram do papel de pai e abandonaram os filhos. Aos homens que se separam não só das mulheres, mas também dos filhos. A todos os pais ausentes.

Para ti o que é ser pai? Aparentemente, pagar uma pensão mensal (ou não) e telefonar de vez em quando? É postar no Facebook fotos “felizes” dos filhos de um fim de semana raro de visita?

Falo com conhecimento de causa.

Perdeste um grande aprendizado na vida. Perdeste a oportunidade de ensinar os teus filhos a dar os primeiros passos. Perdeste noites de sono recompensadas com sorrisos e um cheirinho incrível de bebé. Não viste a tua filha vestir-se de princesa e acreditar na fada dos dentes. Não percebeste que o teu filho não gosta de futebol, mas adora o mar e uma prancha de surf.

Depois da separação achaste que não tinhas mais obrigações na educação dos teus filhos. Concluíste que não dás conta da nova mulher e dos filhos antigos. Eles já não se enquadram na tua nova vida, não é?

É uma pena que não tenhas enlouquecido como eu com os TPC, as zangas e os morreres de amores com os amiguinhos, a conversa sem fim a seguir à escola, as febres, as viroses, as atividades, as contas por pagar.

Tenho pena que seja uma chatice para ti ficares com os teus filhos de vez em quando.

Mal pensas nos teus filhos que abandonaste nas mãos de uma mulher que, teve de ser forte e de criar um ser humano e um futuro cidadão completamente sozinha. Que pena que não te lembres da data de aniversário da tua criança. E que nem vás saber se um dia vai entrar na faculdade ou se vai passar dificuldades na vida.

Não é para o teu colo que o teu filho vai correr quando precisar de chorar. Ufa, certo?

Não é o carinho dele que vais sentir sempre que caíres sem ninguém para te amparar. Não são aquelas mãozinhas pequenas com verniz vermelho que vais segurar depois de um dia de trabalho.

Felizmente, não terás preocupação nenhuma, até porque está alguém a criar (e bem) os teus filhos. Felizmente, não vais perder horas de sono quando o teu filho for sair à noite. Nunca terás vontade de bater na parede para aguentar uma birra terrível sem te passares. Que sorte, não terás cabelos brancos tão cedo.

Não vais dormir exausto depois de fazer os TPC, ir à  natação, ao ballet, ao inglês. Não vais chorar ao veres o teu filho chorar também.

O fim de semana é só por tua conta! Que maravilha! Nunca vais ter de ensinar alguém a andar de bicicleta e não vais ficar com dores nas costas de tanto empurrar. Nunca sentirás aquela alegria de veres o teu filho a pedalar sozinho depois de várias tentativas. Nunca perderás o teu tempo a ver o pôr do sol ao lado do teu filho, nem a falar sobre o universo e as coisas mais estapafurdias da vida.

É uma pena que sejas apenas pai de certidão de nascimento (às vezes nem isso), e nunca vás experienciar nada disto. Nem a parte boa nem a parte má. Não saberás o que é amor incondicional. O que é ter um companheiro para o resto da vida que vai te amar com todas as forças que tem.

Mas sabes, podes ficar tranquilo. Os teus filhos vão crescer saudáveis, inteligentes, com alguns traumas, mas como se costuma dizer, “o que não te mata torna-te mais forte”. Nada que os marque para sempre, porque os teus filhos ficaram com a mãe.

A Mãe de verdade. Que às vezes sente vontade de fugir, que se tranca na casa de banho a chorar, que fica exausta e irritada com os choros, as manhas e as malcriações. Esta mães consegue ter os mais variados sentimentos dentro de si e ainda assim amar tanto os seus filhos que aguenta tudo por eles.

Por isso, descansa, fica tranquilo.

Os teus filhos estão a ser bem cuidados.

E tu podes continuar livre e desocupado.

Por Aline Rolo em ObviousMagazine

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